terça-feira, 30 de junho de 2020

«Quem vos recebe, a Mim recebe»


«Quem acolher este menino em meu nome, é a Mim que acolhe», diz o Senhor (Lc 9,48). Quanto mais pequeno for esse irmão que se acolhe, mais Cristo estará presente nele. Porque, quando recebemos uma pessoa importante, é muitas vezes por vã glória que o fazemos; mas aquele que recebe um pequenino, fá-lo com uma intenção pura e por Cristo. «Eu era peregrino e recolhestes-Me», disse o Senhor. E ainda: «Sempre que fizestes isto a um destes meus irmãos mais pequeninos, a Mim mesmo o fizestes» (Mt 25,35.40). Tratando-se de um crente e de um irmão, por mais pequeno que seja, é Cristo que com ele entra. Abre, pois, a porta de tua casa e acolhe-O.

«Quem recebe um profeta por ele ser profeta, receberá recompensa de profeta». Portanto, aquele que receber a Cristo, receberá a recompensa da hospitalidade de Cristo. Não ponhas em causa estas palavras, confia nelas. Ele próprio no-lo disse: «Neles, sou Eu que apareço». E para que não duvides, o Senhor decreta um castigo para aqueles que não O receberem, e honras para os que O receberem (Mt 25,31s); ora, não o faria se não fosse pessoalmente tocado pela honra ou pelo desprezo. «Acolheste-Me», diz, «em tua casa, Eu receber-te-ei no Reino de meu Pai. Libertaste-Me da fome, Eu te libertarei dos teus pecados. Visitaste-Me quando estava preso, Eu te farei conhecer a libertação. Acolheste-Me quando era estrangeiro, Eu farei de ti um cidadão dos Céus. Deste-Me pão, Eu te darei o Reino como herança e tua plena propriedade. Ajudaste-Me em segredo, Eu proclamá-lo-ei publicamente, chamando-te meu benfeitor e a Mim, teu devedor».

São João Crisóstomo (c. 345-407)
presbítero de Antioquia, bispo de Constantinopla, 
Homilias sobre os Atos dos Apóstolos, n.° 45; PG 60, 318

sábado, 27 de junho de 2020

«Senhor, eu não sou digno de que entres em minha casa».




Que procuras? A felicidade. [...] Procuras uma coisa boa, mas que não existe neste mundo. [...] Tendo vindo até junto de nós, Cristo encontrou o que nós temos em abundância: penas, dores e a morte; é o que tens, e o que entre nós existe em abundância. Ele comeu contigo o que havia em abundância na pobre casa da tua infelicidade. Ele bebeu vinagre, ele provou fel (Jo 19,29) – tudo quanto encontrou na tua pobre casa.

Mas convidou-te para a sua mesa magnífica, para a sua mesa do Céu, para a sua mesa dos Anjos, onde Ele mesmo é o pão (Jo 6,34). Descendo até ti, e encontrando infelicidade na tua pobre casa, não desdenhou de Se sentar à tua mesa, tal como era, e prometeu-te a sua. [...] Assumiu a tua infelicidade, para te dar a sua felicidade. E dar-te-á, pois prometeu-nos a sua vida.

E aquilo que realizou é ainda mais incrível: deu-nos em penhor a sua própria morte. É como se nos tivesse dito: «Convido-vos para a minha vida, onde ninguém morre, onde se encontra a verdadeira felicidade, onde o alimento não se corrompe, mas restaura, nunca falta e tudo preenche”. Vede para onde vos convido: para a terra dos Anjos, para a amizade do Pai e do Espírito Santo, para uma refeição eterna, para a minha amizade fraterna. Enfim, convido-vos para Mim mesmo, convido-vos para a minha própria vida. Duvidais de que vos darei a minha vida? Tendes a minha morte como testemunho.


Santo Agostinho (354-430)
Bispo de Hipona (norte de África). Sermão 231

quinta-feira, 25 de junho de 2020

«O que escutais ao ouvido, proclamai-o sobre os telhados»


Não comecei este trabalho por mim próprio; foi Cristo Senhor que me ordenou que viesse passar o resto dos meus dias junto dos irlandeses pagãos – se o Senhor assim quiser e se Ele me guardar dos maus caminhos. [...] Mas não confio em mim próprio enquanto resido neste corpo de morte (cf 2Pe 1,13; Rom 7,24). [...] Não levei uma vida perfeita como outros fiéis, mas confesso-o ao meu Senhor e não me envergonho na sua presença. Porque eu não minto: depois que O conheci na minha juventude, o amor de Deus cresceu em mim, assim como o seu temor, e até ao presente, pela graça do Senhor, «guardei a fé» (2Tim 4,7).

Que se ria pois e me insulte quem quiser; eu não me calarei nem esconderei «os sinais e as maravilhas» (Dan 6,27) que o Senhor me mostrou muitos anos antes de se terem realizado, pois Ele conhece todas as coisas. Por isso, dou sem cessar graças a Deus, que tantas vezes perdoou os meus disparates e a minha negligência, e não Se irritou uma única vez comigo, a quem fez bispo. O Senhor «teve piedade» de mim «em favor de milhares e milhares de homens» (Ex 20,6), porque viu que eu estava disponível. [...] Com efeito, muitos foram os que se opuseram a esta missão; falavam mesmo entre si nas minhas costas e diziam: «Porque se lança ele nesta tarefa tão perigosa, entre estrangeiros que não conhecem a Deus?». Não era por malícia que se exprimiam assim; eu próprio, o confirmo: por causa da minha rudeza, não conseguem compreender porque fui nomeado bispo. E eu próprio demorei a reconhecer a graça que estava em mim; mas tudo isso se tornou claro.

Agora, explico com simplicidade aos meus irmãos e aos companheiros que acreditaram em mim porque preguei e continuo a pregar (2Cor 13,2), com o fim de fortificar e confirmar a sua fé. Possais vós ambicionar também as metas mais elevadas e realizar as obras mais excelentes. Isso será a minha glória, porque «um filho sábio é a glória do seu pai» (Prov 10,1).


São Patrício (c. 385-c. 461)
monge missionário, bispo
Confissão, §§ 43-47

Venerável Santo Onofre, o Grande


São Panúfio, que levou uma vida ascética no deserto Tebaída, no Egito, nos deixou um relato de Santo Onofre, o Grande, e de outros eremitas do século IV: Timóteo, o habitante do deserto; e os Abbas André, Charalampo, Teófilo e outros.

São Panúfio rumou para o interior do deserto buscando saber se havia algum monge que se esforçava para o Senhor mais do que ele. Ele levou um pouco de pão e água e partiu para a região mais remota. Depois de quatro dias chegou numa caverna, onde encontrou o corpo de um Ancião que havia morrido há vários dias. Tendo sepultado o falecido, São Panúfio prosseguiu.

Vários dias transcorreram até que ele encontrasse outra caverna, e pelas marcas no chão concluiu que ela havia sido habitada. Ao cair da tarde, viu um bando de búfalos e um homem andando no meio deles. Esse homem estava nu, mas se cobria com um longo cabelo, usado como se fosse roupa. Era Abba Timóteo, o Habitante do Deserto.

Vendo um semelhante, Abba Timóteo pensou ser uma aparição e começou a orar. São Panúfio finalmente o convenceu de que estava vendo realmente um homem e um irmão de fé. O eremita preparou comida e água para ele e lhe relatou que vivia no deserto há trinta anos, sendo Panúfio o primeiro homem que via desde então. Em sua juventude, Timóteo havia vivido em um mosteiro, mas quis permanecer solitário. Deixou sua comunidade e se estabeleceu próximo a uma cidade, se sustentando com o trabalho de suas próprias mãos [ele era um tecelão]. Mas certa feita, pecou com uma mulher. Caindo em si, o monge decaído adentrou o deserto, onde pacientemente suportou tribulações e doença. Quando estava a ponto de morrer de fome, recebeu a cura de um modo miraculoso.

Daí em diante, Abba Timóteo viveu pacificamente em solidão completa, comendo os frutos das árvores e matando a sede em uma fonte. São Panúfio perguntou ao Ancião se devia permanecer também no deserto. Mas o eremita lhe disse que ele não seria capaz de suportar as tentações demoníacas que assaltavam os habitantes do deserto. Em vez disso, ele o supriu com frutos e água e o abençoou para seguir seu caminho.

Tendo descansado em um mosteiro do deserto, São Panúfio realizou uma segunda viagem ao deserto mais profundo, esperando encontrar algum santo asceta que ensinasse a sua alma. Caminhou por dezessete dias, até que seu suprimento de pão é água se exauriu. São Panúfio caiu duas vezes por causa da fraqueza, mas um anjo o fortaleceu para que pudesse continuar sua jornada. No décimo sétimo dia, ele alcançou uma região montanhosa e sentou para descansar. Ali ele viu um homem se aproximar dele, e estava coberto dos pés à cabeça como cabelos brancos e as constas cingidas com plantas do deserto. A visão do ancião amedrontou Abba Panúfio, e ele pulou de onde estava e correu, subindo a montanha. O Ancião se sentou no sopé do monte e, levantando sua cabeça, viu São Panúfio e o chamou. Esse era o grande habitante do deserto Santo Onofre.

Santo Onofre vivia em completa solidão nos ermos por sessenta anos. Em sua juventude, foi monge em uma comunidade próxima à cidade de Hermópolis. Vindo a saber dos Santos Padres e da vida dos Ascetas do Deserto, a quem o Senhor enviava a ajuda dos anjos, aspirou imitar seus esforços. Deixou o mosteiro em segredo e viu um raio brilhante de luz diante dele. Atemorizado, decidiu voltar, mas a voz de seu Anjo da Guarda lhe dizia para prosseguir para o deserto para servir ao Senhor. Depois de caminhar mais de dez quilômetros, chegou a uma caverna. Ela era habitada por um homem, com quem Santo Onofre permaneceu e aprendeu a maneira de vida e de luta contra as tentações demoníacas. Quando o Ancião se convenceu que Santo Onofre havia alcançado alguma iluminação, levou-o a outra caverna e o deixou sozinho para lutar pelo Senhor. O Ancião o visitava uma vez por ano, até que adormeceu no Senhor.

A pedido de São Panúfio, Abba Onofre lhe contou de seus trabalhos e ascetismo, e de como o Senhor tomou conta dele. Próxima à caverna havia uma palmeira e uma fonte de água pura. Doze ramos diferentes da palmeira davam frutos, cada um em um mês, sucessivamente, e assim o monge não passava nem fome nem sede. A sombra da palmeira o protegia durante o calor do dia. Um anjo lhe trazia a Santa Eucaristia a cada sábado e domingo, e também o fazia para outros habitantes do deserto. Os dois conversaram até o anoitecer, quando Abba Panúfio notou um pedaço de pão branco ao seu lado junto a uma jarra de água. Depois de comer, os anciãos passaram a noite em oração. Depois de cantarem os salmos da manhã, São Panúfio viu que o rosto do Venerável Onofre havia se transformado, e se assustou. Santo Onofre disse, ''Deus, que é misericordioso com todos, te enviou para que sepulte meu corpo. Hoje terminarei o curso de minha vida terrena e partirei para Cristo, para viver eternamente em Seu repouso.'' Santo Onofre pediu-lhe então que lembrasse dele para todos os cristãos.

São Panúfio queria permanecer lá após a morte de Abba Onofre. Entretanto, o santo asceta lhe disse que não era essa a Vontade de Deus, e sim que retornasse ao seu próprio mosteiro e contasse a todos sobre as vidas virtuosas dos eremitas. Tendo então abençoado São Panúfio e dele se despedido, Santo Onofre orou e adormeceu no Senhor, pronunciando suas palavras finais: ''Em suas mãos, meu Deus, entrego meu espírito''.

São Panúfio cobriu o rosto do grande asceta com um pedaço de suas próprias vestes, e o colocou no interior de uma rocha, que lhe serviu então de túmulo. Depois o cobriu com muitas pequenas pedras. Orou ao Senhor para que lhe permitisse ficar naquele lugar até o fim dos seus dias. Mas repentinamente, a fonte de água secou e a palmeira morreu. Percebendo que não havia recebido benção para permanecer ali, São Panúfio iniciou sua jornada de re
torno.

Depois de quatro dias, Abba Panúfio encontrou uma caverna, onde encontrou outro asceta que vivia no deserto há sessenta anos. Exceto por dois outros anciões, que o acompanhavam em seu ascetismo, ele não havia visto ninguém mais por todo esse tempo. A cada semana os três seguiam por caminhos solitários no deserto, e no sábado e domingo se reuniam para a salmodia e comiam os pães que os anjos lhe traziam. Depois de se alimentarem com o pão trazido por anjos, eles passaram a noite inteira em oração. Quando partia, São Panúfio perguntou o nome dos eremitas, mas eles disseram, ''Deus, que sabe de todas as coisas, conhece-nos pelo nome. Lembre de nós, para que nos encontremos em uma outra das habitações celestiais de Deus.''

Continuando seu caminho, São Panúfio chegou a um oásis que o impressionou pela beleza e abundância de árvores repletas de frutos. Quatro jovens habitavam esse lugar, e lhe contaram que na infância viveram na cidade de Oxyrhyncus. Mas neles cresceu o desejo de dedicarem suas vidas completamente a Deus. Fazendo planos para partirem para o deserto, deixaram a cidade e, depois de vários dias de viagem, chegaram àquele lugar. Um homem radiante com a glória divina os encontrou e os deixou com um ancião. ''Nos encontramos aqui há seis anos'', disseram-lhe, ''e nosso ancião viveu conosco por um ano, e então morreu. Agora vivemos sós, comemos dos frutos das árvores e temos água de uma fonte.'' Os nomes dos jovens eram Santos João, André, Heraclemon e Teófilo [comemorados em 2 de dezembro].

Os jovens lutavam separadamente por toda a semana, mas nos sábados e domingos se encontravam no oásis para as orações em comum. Nesses dias, um anjo aparecia e comungava com eles os Santos Mistérios. Dessa vez, no entanto, por causa de São Panúfio eles não foram para o deserto, mas permaneceram com ele a semana inteira em oração. No fim de semana seguinte, São Panúfio também recebeu os Santos Mistérios das mãos do anjo, e ouviu essas palavras, ''Receba o alimento imperecível, a bem aventurança e vida eterna, o Corpo e Sangue do Senhor Jesus Cristo, Nosso Deus.''

São Panúfio pediu permissão ao anjo para permanecer no deserto até o fim dos seus dias. Mas o anjo respondeu que Deus havia decretado diferente para ele. Ele deveria retornar ao Egito e contar aos cristãos sobre a vida dos habitantes do deserto.

Tendo se despedido dos jovens, São Panúfio alcançou as bordas do deserto depois de três dias de viagem. Ali encontrou um pequeno skete, e foi recebido com amor pela comunidade. Abba Panúfio relatou tudo o que havia aprendido sobre os Santos Padres que encontrou no deserto. A comunidade escreveu detalhadamente os relatos e os depositaram na Igreja, de modo que todos pudessem lê-los. São Panúfio deu graças a Deus e retornou ao seu próprio mosteiro.

«João não era a luz, mas veio para dar testemunho» (Jo 1,8)



O facto de o nascimento de João ser comemorado quando os dias começam a diminuir e o do Senhor quando os dias começam a aumentar tem um significado simbólico. Com efeito, o próprio João revelou o segredo desta diferença. As multidões tomavam-no pelo Messias em razão das suas virtudes eminentes, e alguns consideravam que o Senhor não era o Messias, mas um profeta, devido à fragilidade da sua condição corporal. E João declarou: «Convém que Ele cresça e que eu diminua» (Jo 3,30). E o Senhor cresceu verdadeiramente, porque, quando foi olhado como profeta, deu a conhecer aos crentes do mundo inteiro que era o Messias. João diminuiu, porque aquele que as pessoas julgavam ser o Messias lhes apareceu, não como Messias, mas como anunciador do Messias.

É normal, pois, que a luz dos dias comece a diminuir a partir do nascimento de João, dado que a sua reputação de divindade havia de desaparecer, assim como o seu batismo. E também é normal que a luz dos dias recomece a aumentar a partir do nascimento do Senhor, pois Ele veio à Terra trazer aos pagãos as luzes de um conhecimento que, até então, só os judeus possuíam em parte, e difundir por todo o mundo o fogo do seu amor.



São Beda o Venerável (c. 673-735), monge beneditino.
Homilia II, 20; CCL 122, 328-330

quarta-feira, 26 de fevereiro de 2020

“Suas Cicatrizes Nos Curaram”




Nos conta São João que Jesus tinha dito: Destruí este templo e em três dias o erguerei. Mas ele – observa o evangelista – falava do templo do seu corpo. E se é verdade que o Pai fez tudo por sua Palavra, por seu Filho, não é menos evidente que a ressurreição de sua carne a consumou por seu próprio Filho. Portanto, por meio dele o ressuscita e por meio dele lhe dá a vida. Enquanto homem é ressuscitado segundo a carne, e enquanto homem recebe a vida, quem agiu como um homem qualquer.

Mas ele é ainda quem, em sua qualidade de Deus, levanta o seu próprio templo e comunica a vida a sua própria carne. Enquanto por um lado nos diz: Por eles me consagro para que também eles se consagrem na verdade. E quando diz: Deus meu, Deus meu, por que me abandonastes?, fala como nosso representante, já que assumiu a condição de escravo, fazendo-se semelhante aos homens. E assim, encontrado com aspecto humano, se humilhou fazendo-se obediente até a morte, e morte de cruz. E como disse Isaías: Ele suportou nossos sofrimentos e padeceu nossas dores.

Sendo assim, não foi vexado de dores por sua causa, mas pela nossa; nem foi abandonado por Deus, mas nós; e por nós, os abandonados, ele veio ao mundo. E quando diz: Por isso, Deus o exaltou acima de tudo e lhe deu o nome que está acima de todo nome, fala do templo de seu corpo.

Realmente, não é o Altíssimo quem é exaltado, mas a carne do Altíssimo; e é para a carne do altíssimo que se concedeu o “nome que está acima de todo nome”. E quando disse: o Espírito ainda não tinha sido dado, porque Jesus não havia sido glorificado, fala da carne de Cristo que ainda não estava glorificada. Pois não é o Senhor da glória que é glorificado, mas a carne do Senhor da glória; esta recebeu a glória junto com ele quando subiu ao céu. Por isso, o espírito de adoção ainda não fora dado aos homens, porque as primícias que o Verbo tinha assumido da natureza humana ainda não haviam subido ao céu.

Portanto, quando a Escritura utiliza expressões tais como: “o Filho recebeu”, ou “o Filho foi glorificado”, referem-se a sua humanidade, não a sua divindade. Assim, enquanto alguns textos dizem: Aquele que não poupou ao seu próprio Filho, mas que o entregou à morte por nós, outros afirmam: Como Cristo amou a sua Igreja e se entregou por ela.

Deus, que é imortal, não veio para salvar-se a si mesmo, mas para libertar-nos, a nós que estávamos mortos; nem padeceu por si mesmo, mas por nós, e de tal forma ele assumiu nossa miséria e nossa pobreza, que foi com a finalidade de enriquecer-nos com a sua riqueza. Pois sua paixão é nossa alegria; sua sepultura, nossa ressurreição; e seu batismo, nossa santificação. De fato, ele afirma: Por eles me consagro, para que também eles se consagrem na verdade. E seus sofrimentos são nossa salvação, porque suas chagas nos curaram. O castigo suportado por ele é a nossa paz, já que nosso salutar castigo recaiu sobre ele, isto é, foi castigado para merecermos a paz.

E quando na cruz exclama: Pai, em tuas mãos entrego o meu espírito, encomenda ao Pai, nele mesmo, a todos os homens que nele são vivificados. Somos realmente seus membros, e ainda que sejam muitos os membros, formamos um só corpo, que é a Igreja. É o que diz São Paulo escrevendo aos gálatas: Porque todos vós sois um só em Cristo Jesus. Desta forma, nele, nos encomenda a todos.



Santo Atanásio, Bispo de Alexandria (séc. IV)

Quarenta dias para crescer no amor de Deus e do próximo


Evangelho segundo São Mateus 6,1-6.16-18.

Naquele tempo, disse Jesus aos seus discípulos: «Tende cuidado em não praticar as vossas boas obras diante dos homens, para serdes vistos por eles”. Aliás, não tereis nenhuma recompensa do vosso Pai que está nos Céus.
Assim, quando deres esmola, não toques a trombeta diante de ti, como fazem os hipócritas, nas sinagogas e nas ruas, para serem louvados pelos homens. Em verdade vos digo: já receberam a sua recompensa.
Quando deres esmola, não saiba a tua mão esquerda o que faz a tua direita,
Para que a tua esmola fique em segredo; e teu Pai, que vê o que está oculto, te dará a recompensa.
Quando rezardes, não sejais como os hipócritas, porque eles gostam de orar de pé, nas sinagogas e nas esquinas das ruas, para serem vistos pelos homens. Em verdade vos digo: já receberam a sua recompensa.
Tu, porém, quando rezares, entra no teu quarto, fecha a porta e ora a teu Pai em segredo; e teu Pai, que vê o que está oculto, te dará a recompensa.
Quando jejuardes, não tomeis um ar sombrio, como os hipócritas, que desfiguram o rosto, para mostrarem aos homens que jejuam. Em verdade vos digo: já receberam a sua recompensa.
Tu, porém, quando jejuares, perfuma a cabeça e lava o rosto,
“Para que os homens não percebam que jejuas, mas apenas o teu Pai, que está presente no que é oculto; e teu Pai, que vê o que está oculto, te dará a recompensa».

Quarenta dias para crescer no amor de Deus e do próximo

Iniciamos hoje os santos quarenta dias da quaresma, e convém-nos examinar atentamente por que razão esta abstinência é observada durante quarenta dias. Moisés jejuou quarenta dias para receber a Lei pela segunda vez (Ex 34,28). Elias, no deserto, absteve-se de comer durante quarenta dias (1Rs 19,8). O Criador, ao vir para o meio dos homens, não tomou qualquer alimento durante quarenta dias (Mt 4,2). Esforcemo-nos também nós, tanto quanto nos for possível, por refrear o nosso corpo pela abstinência neste tempo anual dos santos quarenta dias [...], a fim de nos tornarmos, na palavra de Paulo, «uma hóstia viva» (Rom 12,1). O homem torna-se uma oferenda viva e imolada (cf Ap 5,6) quando, sem deixar esta vida, faz morrer nele os desejos deste mundo.

Foi a satisfação da carne que nos levou ao pecado (Gn 3,6); que a carne mortificada nos leve ao perdão. O autor da nossa morte, Adão, transgrediu os preceitos de vida comendo o fruto da árvore proibida. Por conseguinte, é necessário que nós, que fomos privados das alegrias do Paraíso pelo alimento, nos esforcemos por reconquistá-las pela abstinência.

Mas ninguém suponha que esta abstinência é suficiente. O Senhor disse pela boca do profeta: «O jejum que Eu aprecio é este, [...] repartir o teu pão com o esfomeado, dar abrigo aos infelizes sem asilo, vestir o nu, e não desprezar o teu irmão» (Is 58,6-7). Eis o jejum que Deus aprova [...]: um jejum realizado no amor ao próximo e impregnado de bondade. Prodigaliza, pois aos outros aquilo de que te privas; desse modo, a tua penitência corporal permitir-te-á atender ao teu próximo.



São Gregório Magno (c. 540-604),Papa.
Homilias sobre os evangelhos, n.º 16, 5

Tempo da Quaresma.



Na linguagem corrente, a Quaresma abrange só os dias que vão da Quarta-feira de Cinzas até ao Sábado Santo. Contudo a liturgia propriamente quaresmal começa com o primeiro Domingo da Quaresma e termina com o sábado antes do Domingo da Paixão.

A Quaresma pode ser considerada, no ano litúrgico, o tempo mais rico de ensinamentos. Lembra o retiro de Moisés, o longo jejum do profeta Elias e do Salvador. Foi instituída como preparação para o Mistério Pascal.

Data dos tempos apostólicos - A Quaresma como sinônimo de jejum observado por devoção individual na Sexta-feira e Sábado Santo, e logo estendido a toda Semana Santa. Na segunda metade do século II, a exemplo de outras igrejas, Roma introduziu a observância quaresmal em preparação para a Páscoa, limitando, porém, o jejum a três semanas somente: a primeira e quarta da atual Quaresma e Semana Santa. A verdadeira Quaresma com os quarenta dias de jejum e abstinência de carne, data do século IV.

O jejum consistia originalmente numa única refeição tomada a tardinha;  por volta do ano 1000 antecipou-se para as três horas da tarde e no século XV tornou-se uso comum o almoço ao meio-dia. Com o correr do tempos, verificou que era demasiado penosa a espera de vinte e quatro horas; foi-se, por isso, introduzindo o uso de se tomar alguma coisa a tarde, e logo mais também pela manhã, costuma que vigora ainda hoje. O jejum atual, portanto, consiste em tomar uma só refeição diária completa, na hora de costume: pela manhã, ao meio-dia ou a tarde, com duas refeições leves restante do dia.

Comentários dogmáticos - "Todos pecamos, e todos precisamos fazer penitência" afirma São Paulo. A penitência é uma virtude sobrenatural (intimamente ligada a virtude da justiça) , que inclina o pecador a detestar o pecado, a repará-lo dignamente e a evitá-lo no futuro. 
Os motivos principais, que nos obrigam a penitência são: a) o dever de justiça para com Deus, a quem devemos honra  e glória, que lhes negamos com o nosso pecado; b) a nossa incorporação com Cristo, o qual, inocente, expiou os nossos pecados; nós culpados, devemos associar-nos a ele, no Sacrifício da Cruz, com generosidade e verdadeiro espírito de reparação. c) o dever da caridade para com nós mesmos que precisamos descontar as penas merecidas com os nossos pecados e reprimir nossas paixões. d) o dever de caridade para com o nosso próximo, que afastamos de Deus com os maus exemplos.

Vê-se daí, útil para o pecador aproveitar o tempo da Quaresma para multiplicar as boas obras, e assim dispor-se para a conversão.

Na próxima postagem colocarei os ensinamentos ascético dos Santos Padres da Igreja.

Marcos Vinícius Faria de Moraes.

domingo, 23 de fevereiro de 2020

Domingo da Quinquagésima



II classe - Estação em São Pedro

O cego sentado a beira da estrada (cf. Lc. 18, 31-43), figura da humanidade abandonada a si mesma sob a tirania das paixões e do demônio, do erro e da ignorância. Jesus veio ilumina-la com sua doutrina, redimi-la e liberta-lá com o seu Sangue  precioso. Neste tempo litúrgico, meditemos mais com devoção e assiduidade na Paixão do Redentor e procuremos com penitência, expiar os pecados (cf.Sl 118, 13), que se multiplicam de maneira horripilante no carnaval. Observemos sempre melhor os mandamentos, compendiados no preceito da caridade (cf. 1 Cor 13, 1-13), e suportemos com Jesus as adversidade, os desprezos, os sacrifícios e as tentações, para participar mais ativamente de sua Paixão. A comunhão aplica-se os frutos do Sacrifício da Cruz, fortifica-nos nas adversidades e une-nos intimamente a Jesus Cristo.

MARCOS VINÍCIUS FARIA DE MORAES

sábado, 22 de fevereiro de 2020

«Abre os meus olhos [...] às maravilhas da tua lei» (Sl 118,18)


Evangelho segundo São Marcos 8, 22-26.



Naquele tempo, Jesus e os seus discípulos chegaram a Betsaida. Trouxeram-Lhe então um cego, suplicando-Lhe que o tocasse.
Jesus tomou o cego pela mão e levou-o para fora da localidade. Depois colocou saliva nos olhos, impôs-lhe as mãos e perguntou-lhe: «Vês alguma coisa?».
Ele abriu os olhos e disse: «Vejo as pessoas, que parecem árvores a andar».
Em seguida, Jesus impôs-lhe novamente as mãos sobre os olhos e ele começou a ver bem: ficou restabelecido e via tudo claramente.
Então Jesus mandou-o para casa e disse-lhe: «Não entres sequer na povoação».


«Abre os meus olhos [...] às maravilhas da tua lei» (Sl 118,18).


«Jesus tomou o cego pela mão e levou-o para fora da localidade. Depois deitou-lhe saliva nos olhos, impôs-lhe as mãos e perguntou-lhe: "Vês alguma coisa?"» O conhecimento é sempre progressivo. [...] Só à custa de muito tempo e de uma longa aprendizagem podemos atingir um conhecimento perfeito. Primeiro, saem as sujidades e a cegueira desaparece; e é assim que vem a luz. A saliva do Senhor é um ensinamento perfeito; para ensinar de forma perfeita, ela provém da boca do Senhor. A saliva do Senhor provém, por assim dizer, da sua substância; e o conhecimento, sendo a palavra que provém da sua boca, é um remédio. [...]

«Vejo as pessoas, que parecem árvores a andar»; ainda vejo sombras, ainda não vejo a verdade. Eis o sentido desta palavra: vejo qualquer coisa na Lei, mas ainda não tenho a percepção da luminosidade radiosa do Evangelho. [...] «Jesus impôs-lhe novamente as mãos sobre os olhos e ele começou a ver bem: [...] via tudo claramente». Via, digo eu, tudo o que nós vemos: via o mistério da Trindade, via todos os mistérios sagrados que estão no Evangelho. [...] Nós também os vemos, porque acreditamos em Cristo, que é a verdadeira luz.



São Jerónimo (347-420)
presbítero, tradutor da Bíblia, para os latinos.
Homilias sobre o Evangelho de Marcos, n.° 8, 235

«Pedro tomou-O à parte e começou a contestá-lo»


Evangelho segundo São Marcos 8, 27-33.


Naquele tempo, Jesus partiu com os seus discípulos para as povoações de Cesareia de Filipe. No caminho, fez-lhes esta pergunta: «Quem dizem os homens que Eu sou?».

Eles responderam: «Uns dizem João Batista; outros, Elias; e outros, um dos profetas».
Jesus então perguntou-lhes: «E vós, quem dizeis que Eu sou?». Pedro tomou a palavra e respondeu: «Tu és o Messias».

Ordenou-lhes então severamente que não falassem dele a ninguém.
Depois, começou a ensinar-lhes que o Filho do homem tinha de sofrer muito, de ser rejeitado pelos anciãos, pelos sumos sacerdotes e pelos escribas; de ser morto e ressuscitar três dias depois.
E Jesus dizia-lhes claramente estas coisas. Então, Pedro tomou-O à parte e começou a contestá-lo.
Mas Jesus, voltando-Se e olhando para os discípulos, repreendeu Pedro, dizendo: «Vai-te, Satanás, porque não compreendes as coisas de Deus, mas só as dos homens».

«Pedro tomou-O à parte e começou a contestá-lo»
 

Não devemos ter vergonha da cruz do Salvador, mas gloriar-nos nela. «A linguagem da cruz é escândalo para os judeus e loucura para os gentios», mas para nós é salvação. É loucura para os que se perdem e poder de Deus para os que se salvam ( 1Cor 1,18-24). Não foi apenas um homem que morreu, mas o Filho de Deus, Deus feito homem. No tempo de Moisés, o cordeiro afastou o anjo exterminador (Ex 12,23); pois muito mais «o Cordeiro de Deus que vai tirar o pecado do mundo» (Jo 1,29) nos libertou dos nossos pecados. [...]

Ele não deixou esta vida, obrigado não foi imolado à força, mas pela sua própria vontade. Escutai o que nos diz: «Tenho poder para dar e para tornar a tomá-la» (Jo 10,18). [...] Entregou-Se deliberadamente à sua Paixão, feliz na sua entrega, sorrindo ao seu triunfo, contente por salvar os homens. Não teve vergonha da cruz, porque salvava o mundo. Não era um pobre homem que sofria, mas Deus feito homem que combatia para obter o preço da paciência. [...]

Não te regozijes na cruz somente em tempo da paz; mantém a fé no tempo da perseguição. Não sejas amigo de Jesus apenas em tempo de paz, para te tornares seu inimigo no tempo da guerra. Agora, recebes o perdão dos teus pecados e os dons espirituais prodigalizados pelo teu rei; quando eclodir a guerra, combate com bravura por Ele. Jesus foi crucificado por ti, Ele que não tinha pecado. [...] Não foste tu que Lhe deste esta graça, pelo contrário, recebeste-a dele. Dá graças Àquele que pagou a tua dívida sendo crucificado por ti no Gólgota.



São Cirilo de Jerusalém (313-350) Patriarca Jerusalém, 
        Catequese baptismal n.° 13, 3.6.23.        

domingo, 16 de fevereiro de 2020

O Justo São Simeão, Recebedor de Deus



O Faraó egípcio Ptolomeu II Philadelphos [285-247 a.C.] desejava acrescentar à famosa Biblioteca de Alexandria os textos das Sagradas Escrituras. Convidou então 72 homens piedosos para Alexandria, para que as traduzissem para o grego.

O Justo Simeão traduziu uma passagem de Isaías [Is:714] com a profecia do nascimento virginal do Messias. Acreditando que a palavra 'virgem' estava sendo usada incorretamente, quis mudá-la para 'mulher'. Foi então que recebeu a visão de um Anjo que lhe pediu que tivesse fé nas palavras que lia e que ele mesmo as veria realizadas, permanecendo vivo até a chegada do Cristo.

A partir de então, São Simeão viveu esperando o cumprimento da promessa, e, guiado pelo Espírito Santo, estava no Templo quando o Deus-menino foi apresentado. Ele faleceu em idade muito avançada e suas relíquias foram transferidas para Constantinopla no século VI. Hoje, elas se encontram em um mosteiro que carrega seu nome em Jerusalém.

sábado, 15 de fevereiro de 2020

S. João Clímaco, "Escada do Céu", VII, I.


Procura sempre andar com um semblante triste, mas modesto, a fim de que não pareça ostentação de santidade. E trabalha sempre por estar atento e cuidadoso da guarda do teu coração; porque os demônios não temem menos a verdadeira tristeza, do que o ladrão teme o cão.

+ S. João Clímaco, "Escada do Céu", VII, I.

Escuta.



“Escuta. O nome do Filho de Deus é grande, imenso e sustenta o mundo inteiro. Se toda a criação é sustentada pelo Filho de Deus, o que pensar então daqueles que foram chamados por ele, que levam o nome do Filho de Deus e andam conforme os seus mandamentos? Estás vendo, portanto, os que ele sustenta? São os que levam o seu nome de todo o coração. Por isso, ele se constituiu alicerce deles e, para ele é uma alegria sustentá-los pois eles não se envergonham de levar o nome dele.”

-Pastor de Hermas, Terceiro Livro, Cap.14

sexta-feira, 14 de fevereiro de 2020

DOMINICA IN SEXAGESIMA

II classis
Statio ad S. Paulum

ANTE-MISSA
Reunidos na basílica de S. Paulo, representada por nossa Igreja, vemos o magnífico exemplo do grande Apóstolo confira em  2 Cor. I I , 19-33 et 12, 1-9

Com Jesus Cristo devemos morrer, para com ele resuscitarmos. Este é o sentido da Quaresma e para isso nos preparamos nos três domingos precedentes. Ele é o Semeador (Evangelho)  confira  emLc 8, 4-15.

Preparemos nossos corações, afastando os obstáculos, que são a indiferença o caminho; a inconstância — as pedras; as paixões — os espinhos. Custe embora é natureza humana, a Igreja o confessa no lntroito. Mas não desanimaremos; contra as adversidades podemos contar com a proteção do Doutor das gente.













domingo, 9 de fevereiro de 2020

Domingo do Publicano e do Fariseu



O Domingo posterior ao Domingo de Zaqueu é devotado ao Publicano e ao Fariseu. 

Dois homens foram ao Templo para orar. O primeiro era um fariseu que observava escrupulosamente as obrigações religiosas: orava, jejuava e contribuía com dinheiro para o Templo. 

Embora realizasse essas boas coisas, o fariseu olhava com desprezo para o publicano, pensando estar justificado tão somente por causa desses atos externos de piedade.

O segundo homem era um publicano, um coletor de taxas desprezado pelo povo. Entretanto, demonstrava grande humildade, e essa virtude o justificava diante de Deus, como dito no Evangelho do Bem Aventurado São Lucas 18:14.

Somos assim chamados a nos observar na luz dos ensinamentos de Cristo, pedindo a Ele que use de Misericórdia para conosco, nos liberte do pecado, e nos guie no caminho da salvação.

Santíssima Mãe de Deus.


Beata Dei Genitrix Maria, * Virgo perpetua, templum Domini, sacrarium Spiritus sancti: sola sine exemplo placuisti Domino nostro Jesu Christo: ora pro populo, interveni pro clero, intercede pro devoto femineo sexu.

Santíssima Mãe de Deus, Maria , * sempre virgem , templo do Senhor , templo do Espírito Santo , ninguém gostava de você como nosso Senhor Jesus Cristo orar pelas pessoas , intervir para o clero , intercede para a vista de mulheres religiosas.

Quando você fecha a porta...


"Quando você fecha a porta da sua casa e fica sozinho, você deve saber que ali está presente o anjo que Deus designou para cada homem. Este anjo, não dorme e nunca é enganado, está sempre presente com você; ele vê todas as coisas e não é impedido pelas trevas. Você deve saber, também, que com ele está Deus, que está presente em toda parte, pois não há lugar e nada material em que Deus não esteja, pois Ele é maior do que todas as coisas e mantém todos os homens em suas mãos."

 (Santo Antônio, o Grande)

TEMPUS SEPTUAGESIMAE DOMINICA IN SEPTUAGESIMA

Statio ad S. Laurentium extra muros
DOMINGO DA SEPTUAGESIMA
iI.cLsd.—U



Neste e nos dois domingos seguintes a Igreja nos reúne na basílica dos três padroeiros de Roma. Hoje em S. Lourenço. Padroeiro dos catecúmenos, isto é, dos que se prepararam para receber o batismo, na noite do sábado que precede ao Domingo da Ressurreição.
O  Papa celebrava outrora a Missa e, provavelmente, estas missas têm a sua origem no tempo das grandes invasões dos bárbaros na Itália. Quer na boca do Mártir S. Lourenço (Statio), quer na dos romanos daquele tempo, as palavras do lntroito traduzem também os nossos sentimentos neste tempo de preparação para a Quaresma.

Justamente aflitos por nossos pecados nos sentimos neste tempo(Oração). O pecado, o perigo do mesmo e suas tentações, a necessidade de combatê-lo e o penoso deste combate são gemidos de morte, dores de inferno até para a alma remida. Mas a nossa tristeza não é sem esperança. Deus, embora castigue o pecado enquanto vivemos, é um Deus misericordioso; é o nosso refugio e o nosso Libertador (lntroito). Recorrendo a Ele, livrar-nos-á misericordiosamente. (Oração). Mas devemos procurá-Lo pelo desejo e pela Oração, e mais ainda pela ação, pelo esforço, pela penitencia. É o que nos ensina a Epistola e o Evangelho.

O CICLO DA PÁSCOA

FAZEI a vossa face resplandecer sobre o vosso servo, e salvai-me por vossa misericórdia. Senhor, não serei confundido, porque Vos invoquei. (Sl. 30,18)

Celebração da Redenção da humanidade


Está encerrada a primeira parte do Ano Eclesiástico, o ciclo de natal, em que se relembra o mistério da Encarnação do Verbo Divino. O Salvador veio ao mundo, e nós alegres o saudamos como Rei e Lhe rendemos a nossa homenagem.
Sua missão é remir a humanidade. Eis o sentido da segunda parte do ano eclesiástico: a celebração do mistério da Redenção. Assim como no Natal teve a sua preparação, o Advento, a sua celebração, natal até epifania, e o seu prolongamento, o tempo depois da epifania, igualmente a Páscoa tem a sua preparação, a Septuagésima, a Quaresma e o Tempo da Paixão, a sua celebração, Páscoa até pentecostes, e seu prolongamento, o Tempo depois de Pentecostes.

1. TEMPO DE PREPARAÇÃO

Nós nos preparamos com Jesus Cristo para receber a vida divina

Três degraus subimos para celebrar a Ressurreição de Jesus Cristo e também para resurgirmos com ele:
1°. O Tempo da Septuagésima;
2°. O Tempo da Quaresma;
3°. O Tempo da Paixão.

1. O TEMPO DA SEPTUAGÉSIMA

1° Significação deste Tempo.

A Septuagésima é a primeira parte oração para a Páscoa e abrange as três semanas anteriores a quaresma. Embora não fossem exatamente 70, 60 e 50 dias antes da festa da ressurreição, em imitação talvez, ao domingo seguinte, Quadragésima, foram estes domingos, denominados: Septuagésima, Sexagésima, Quinquagésima.

A mobilidade da festa da Páscoa faz também variar a data da Septuagésima, que, todavia, ordinariamente se abeira do dia 2 de fevereiro, conclusão do Tempo de Natal.
O domingo da Septuagésima e os dois seguintes são, pois, uma preparação para a Quaresma, tempo de penitencia propriamente dito.

2° Nossos sentimentos durante este Tempo.

Devem conformar-se o espírito do Tempo, que é expresso pelos textos das Missas Ofício divino que os sacerdotes rezam. A lembrança da criação do mundo, da queda no pecado e de todas as suas consequências, sejam: a luta do bem contra o mal, da luz contra as trevas, o sofrimento, eis os assuntos que nos devem ocupar o pensamento durante estas semanas. Começou a luta contra o pecado, contra o mundo e contra a carne.
a) Pelo combate, para a vitoria.
b) Pela cruz para a luz.
c) Pela morte para a vida.
d) Pelo sepulcro, para a Ressurreição com o Cristo!
Jesus Cristo mesmo, nos ensina nos Evangelhos destes domingos estas verdades. e S. Paulo, lutador corajoso, anima-nos por seu exemplo e por sua palavra. Animam-nos ainda os Santos em cujas Igrejas, nos reunimos.

3° Particularidades deste Tempo.

Os sacerdotes trocam os paramentos brancos pelos roxos, em sinal de penitencia. O Gloria in excelsis que se entoava alegremente desde o Natal, não mais é ouvido, exceto nas festas dos Santos. Igualmente desaparece o Aleluia do oficio e das Missas até o Sábado Santo. Nota-se ainda que depois gradual, em vez do Aleluia e seu Versículo, reza-se o Tracto, salmo de penitencia.

domingo, 26 de janeiro de 2020

Para aqueles que habitavam na sombria região da morte, uma luz se levantou»

Evangelho segundo São Mateus 4,12-23.

Quando Jesus ouviu dizer que João Batista fora preso, retirou-Se para a Galileia.
Deixou Nazaré e foi habitar em Cafarnaum, terra à beira-mar,
no território de Zabulão e Neftali. Assim se cumpria o que o profeta Isaías anunciara, ao dizer: «Terra de Zabulão e terra de Neftali, caminho do mar, além do Jordão, Galileia dos gentios: o povo que vivia nas trevas viu uma grande luz; para aqueles que habitavam na sombria região da morte, uma luz se levantou».
Desde então, Jesus começou a pregar: «Arrependei-vos, porque está próximo o reino dos Céus».

Caminhando ao longo do mar da Galileia, viu dois irmãos: Simão, chamado Pedro, e seu irmão André, que lançavam as redes ao mar, pois eram pescadores.
Disse-lhes Jesus: «Vinde e segui-Me, e farei de vós pescadores de homens».
Eles deixaram logo as redes e seguiram-no.
Um pouco mais adiante, viu outros dois irmãos: Tiago, filho de Zebedeu, e seu irmão João, que estavam no barco, na companhia de seu pai Zebedeu, a consertar as redes. Jesus chamou-os, e eles, deixando o barco e o pai, seguiram-no.
Depois começou a percorrer toda a Galileia, ensinando nas sinagogas, proclamando o Evangelho do reino e curando todas as doenças e enfermidades entre o povo.

«Para aqueles que habitavam na sombria região da morte, uma luz se levantou»

Cristo, digna-Te acender pessoalmente as nossas candeias, Tu que és o nosso Salvador; fá-las brilhar sem fim na tua morada e receber de Ti, luz eterna, uma luz indefetível. Que a tua luz dissipe as trevas e, através de nós, faça recuar as trevas do mundo. Peço-Te pois, Jesus, que acendas a minha candeia com a tua própria luz, e que assim, com essa claridade, eu possa ver o Santo dos Santos, onde Tu, Pai Eterno dos tempos eternos, dás entrada nos pórticos desse Templo imenso (cf Heb 9,11ss). Que, sob a tua luz, nunca deixe de Te ver e de dirigir para Ti o meu olhar e o meu desejo. Então, só Te verei a Ti no meu coração, e na tua presença a minha candeia ficará para sempre acesa e ardente.

Dá-nos a graça […], visto que batemos à tua porta, de Te manifestares a nós, Salvador cheio de amor. Compreendendo-Te melhor, que não tenhamos amor senão para Ti, só para Ti. Que sejas, noite e dia, o nosso único desejo, a nossa única meditação, o nosso pensamento contínuo. Digna-Te derramar em nós todo o amor necessário para que possamos amar a Deus como convém. Enche-nos do teu amor […] até que não saibamos amar-Te senão a Ti, que és eterno. Então as águas caudalosas do céu, da Terra e do mar não poderão apagar em nós tão grande caridade, como lemos no Cântico dos Cânticos: «As águas caudalosas não conseguirão apagar o fogo do amor» (8,7). Que se realize em nós, pelo menos em parte, esse crescendo de amor, pela tua graça, Senhor Jesus.



São Columbano (563-615)
monge, fundador de mosteiros
12.ª Instrução espiritual, 2-3.